Apesar do destaque atual, a conservação do solo e da água são temas bastante antigos com relatos históricos, inclusive bíblicos. No Brasil, o assunto também já esteve em pauta há tempos. Um desses registros data da década de 30, especificamente o ano de 1938. Na ocasião, o engenheiro agrônomo Dr. Fernando Penteado Cardoso, escrevera para o Suplemento Agrícola do jornal O Estado de São Paulo o texto denominado “Alerta contra a erosão”, onde procurou mostrar a importância do terraceamento em áreas agrícolas e os desastrosos efeitos da erosão nas propriedades químicas, físicas e biológicas do solo.
Mais recentemente, pesquisadores da Embrapa Trigo e colaboradores, realizaram um estudo mostrando que os níveis de nutrientes nos solos de várzea, próximas a áreas de lavouras, eram muito superiores aos encontrados nas lavouras sem terraceamento. Ao passo que, os níveis destes mesmos nutrientes na lavoura e na várzea, em áreas de cultivo terraceadas, encontravam-se bem semelhantes. Ou seja, por meio deste estudo foi demonstrado que somente a cobertura morta da palhada, em áreas de Plantio Direto, em muitas ocasiões não é suficiente para minimizar os efeitos adversos da erosão.
Em condições tropicais, como é o caso da maior parte do Brasil, a erosão hídrica assume papel de destaque, sendo esta a principal causa de erosão do solo. Este tipo de erosão possui três fases distintas: a desagregação das partículas de solo, o transporte e a deposição destes sedimentos nos cursos d’água.
As pastagens são um dos principais tipos de vegetação que possuem capacidade de manter a cobertura do solo de maneira efetiva e uniforme. Esta afirmação torna-se bastante interessante do ponto de vista de sustentabilidade ambiental, visto que o Brasil possui mais de 100 milhões de hectares ocupados com pastagens. No entanto, observam-se em grande parte dos casos, áreas com pastagens em algum estágio de degradação, tanto do pasto quanto do solo. Por quê?
A resposta para esta questão envolve diversas áreas das ciências agrárias, mas os principais motivos são: espécie forrageira inadequada ao local; má formação inicial (por diversos motivos); manejo e práticas culturais inadequadas; ocorrência de pragas e doenças; manejo animal impróprio (especialmente excesso de lotação e sistemas inadequados de pastejo) e ausência ou aplicação incorreta de práticas de conservação do solo, em função do tipo de solo da propriedade ou da gleba.
Em áreas de pastagens com lotação excessiva, com pouca massa de forragem e solo descoberto, a forrageira perde uma de suas principais funções no que diz respeito à conservação do solo, que é a de minimizar o impacto da gota de chuva diretamente no solo, evitando a desagregação das partículas. Esta é a primeira, e talvez a mais importante, etapa para instalação do processo erosivo no solo em áreas de pastagens tropicais.
Uma das alternativas para minimizar o problema seria o uso de uma ferramenta lançada recentemente pela Embrapa Gado de Corte: a régua de manejo de pastagens. Essa tecnologia tem por objetivo principal determinar a altura de entrada e saída dos animais do piquete, em função da disponibilidade forrageira. No entanto, caso as alturas preconizadas sejam observadas pelos pecuaristas, especialmente a altura de saída dos animais, esta ferramenta será de grande utilidade também para a conservação do solo e da água. Manejando a pastagem corretamente, evitando o manejo popularmente conhecido como “rapadão”, a maior massa de forragem certamente irá contribuir para minimizar o impacto da chuva diretamente no solo e facilitar a infiltração de água no perfil.
Outra prática bastante utilizada e que tem sido subestimada ultimamente é a construção de terraços. O terraceamento em propriedades rurais tem basicamente duas funções: diminuir o comprimento dos lançantes e promover a infiltração de água no solo. Um dos grandes erros cometidos em conservação do solo e da água é o de achar que somente o uso de terraços é suficiente para resolver o problema de erosão na propriedade rural. Para o efetivo controle da erosão do solo em pastagens tropicais, o uso do sistema de terraceamento deve, obrigatoriamente, ser associado a outras práticas de conservação, sendo as principais o manejo do pastejo e o controle da taxa de lotação animal.
O dimensionamento e alocação dos terraços são baseados em vários parâmetros como o tipo de solo, relevo, declividade, cultura a ser implantada, potencial erosivo da chuva na região, etc. Todos os métodos de dimensionamento do sistema de terraceamento na propriedade rural levam em conta, além das características mencionadas, também o potencial de infiltração de água no solo entre um terraço e outro. Propriedades rurais com excesso de lotação animal (taxa de lotação superior à capacidade suporte) e manejo inadequado do pastejo (pouca disponibilidade de massa forrageira e solo descoberto), certamente irão sobrecarregar o sistema de terraços, tornando esta técnica com maior probabilidade de insucesso.
Os cuidados e as observações descritos acima, para propriedades que têm a pecuária como atividade principal, são também válidos para produtores que fazem uso de sistemas de Integração Lavoura-Pecuária ou Integração Lavoura-Pecuária-Floresta. Ressalta-se que o dimensionamento/alocação dos terraços quando em sistemas integrados de produção deve ser realizado com base no componente lavoura, reconhecidamente de maior potencial erosivo. Quando da presença do componente arbóreo em sistemas de produção integrados, este pode, dependendo da disposição dos renques de árvores, contribuir também para minimizar os efeitos da erosão eólica, comum em algumas regiões do Brasil.
É importante frisar que a conservação do solo e da água seja vista de forma sistêmica, abrangendo toda bacia ou sub-bacia. Para se obter sucesso nesta difícil empreitada faz-se necessário o uso integrado de um conjunto de práticas que reduzam o impacto da gota de chuva no solo, diminuam o escorrimento superficial e aumentem a infiltração de água no solo, contribuindo, desta forma, para a recarga de aquíferos e minimizando o assoreamento em córregos, rios e lagos.
A sociedade não agrícola deve estar ciente que, o produtor rural que trabalha de maneira correta a adubação e o manejo das pastagens, bem como utiliza práticas de conservação do solo e da água, certamente estará contribuindo para que as águas das chuvas infiltrem com maior facilidade no perfil do solo, abastecendo o lençol freático, produzindo com sustentabilidade e minimizando, de certa forma, os custos com tratamento de água.
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