Observa-se atualmente aumento no consumo de água pelas grandes cidades e indústrias. Na região Sudeste do Brasil, a crise de abastecimento de água tem imposto o racionamento para milhares de pessoas. Tendo em vista que o setor agropecuário utiliza 70% dos recursos hídricos disponíveis no país, faz-se necessário adotar medidas que viabilizem o uso racional desse recurso indispensável para a manutenção da vida na Terra.
No MATOPIBA, que é a nova fronteira agrícola do País, há uma grande oferta hídrica na estação chuvosa, seguida por um período de seca que chega a durar 150 dias. Portanto, aprendendo com os erros cometidos em outras regiões e aplicando tecnologias para a conservação, correto manejo e uso eficiente dos recursos hídricos, é possível evitar crises de abastecimento e os conflitos decorrentes dessa condição.
Pensando em recursos hídricos no MATOPIBA, a Bacia do Rio Tocantins ocupa 43% da área, seguida da Bacia do Atlântico – trecho Norte/Nordeste, com 40%, e da Bacia do Rio São Francisco, com 17%. Existem rios de significativa importância, como os rios Araguaia, Tocantins, São Francisco, Parnaíba, Itapicuru, Mearim, Gurupi e Pindaré (Magalhães & Miranda, 2014).
Segundo a Secretaria Nacional de Irrigação, do Ministério da Integração Nacional, o Tocantins é o estado que conta com a maior quantidade de solos aptos para desenvolvimento da agricultura irrigada: mais de 4 milhões de hectares. Porém, nem 10% desse potencial para irrigação é utilizado.
O uso da água na agropecuária é feito por meio da irrigação e da dessedentação animal, que estão entre os usos consuntivos previstos pela legislação. Existem novas formas de cultivo que utilizam menos água e de forma mais eficiente, mas também existem formas e tecnologias mais antigas, em que o problema é a sua adoção. Pode-se dividir as tecnologias em dois eixos: as que economizam água; e as que favorecem a sua infiltração no solo.
Tecnologias que economizam água
Neste caso, utiliza-se menos água para a produção de alimentos aumentando a eficiência de uso da água (EUA). Pode-se considerar essa forma como “orientada pela tecnologia”, porque o seu desenvolvimento acontece pelo avanço da pesquisa.
Na produção de sequeiro, são utilizadas plantas mais tolerantes ao estresse hídrico, numa abordagem baseada no melhoramento de plantas e na biotecnologia (incluindo organismos geneticamente modificados – OGMs). Diante das mudanças climáticas globais e da competição pelos recursos naturais solo e água cada vez mais acirrada, essas técnicas têm se desenvolvido rapidamente.
Outra maneira de economizar água é por meio da sua reutilização para atividades que não exijam potabilidade. Em áreas urbanas e industriais, a adoção dessas medidas vem aumentando nos últimos anos. As atividades agropecuárias também podem estabelecer o uso mais consciente, como o tratamento de dejetos animais para a produção de gás, energia e posterior reuso da água.
Em sistemas de produção irrigados, podem ser utilizadas técnicas de irrigação deficitária, onde a demanda hídrica da planta não é plenamente atendida, mas somente o mínimo economicamente viável. O segredo é o manejo adequado do potencial de água no solo, utilizando sensores capazes de identificar os limites estabelecidos como suas capacidades mínima e máxima de retenção de água; ou medindo o fluxo de seiva das plantas, que monitora a atividade estomática, relacionada às estruturas que regulam a evapotranspiração e fazem parte do processo de fotossíntese. Essas técnicas devem estar sempre associadas a tecnologias para monitoramento climático, provendo dados de ajustes para as condições locais, permitindo manejos mais precisos.
Outra estratégia para usar menos água na produção irrigada é o uso de sistemas mais eficientes em sua condução, como microaspersão e gotejamento, que têm eficiência maior que 90%, ao invés de sistemas menos eficientes, como canhão autopropelido, com eficiência menor que 80%. Essa estratégia, aliada aos corretos dimensionamento, monitoramento e manutenção do sistema, é muito eficaz em reduzir o volume de água utilizado pela irrigação. Vale lembrar que a eficiência de um sistema de irrigação também envolve a adequação de seu uso. Para isso, é preciso conhecer quando e como deve ser feita a irrigação de salvamento, a irrigação suplementar e a irrigação plena.
Irrigação de salvamento
Ocorre em regiões em que a demanda hídrica da cultura é quase totalmente atendida, necessitando da irrigação devido à ocorrência de veranicos ou estiagens de curta duração. Utiliza principalmente sistemas portáteis e móveis, como o canhão autopropelido, devido à maior praticidade e necessidade pontual.
Irrigação suplementar
Deve ser praticada em regiões em que a demanda hídrica da cultura é parcialmente atendida, mas há necessidade de irrigar devido à ocorrência de uma estação seca bem definida e com maior duração. Nessa situação, é mais recomendado utilizar sistemas fixos e de alta eficiência, como aspersão convencional, pivôs centrais e lineares.
Irrigação plena
Ocorre em regiões áridas ou semiáridas, em que a demanda hídrica da cultura nunca é atendida, necessitando da irrigação para garantir a produção. Essas regiões são deficientes em recursos hídricos, exigindo sistemas mais eficientes na utilização de água e energia, como os sistemas de irrigação localizada.
Tecnologias que favorecem a infiltração de água no solo
As tecnologias que favorecem a infiltração de água no solo aumentam o volume de água disponível às plantas sem comprometer a recarga do aquífero. Pode-se considerar que essas tecnologias são “orientadas pelo mercado e leis”, pois sua adoção massiva ocorre após a aplicação de barreiras não tarifárias advindas de mercados mais exigentes e com maior consciência ambiental ou de legislações.
Essas tecnologias são baseadas principalmente em práticas de conservação de solo e água, que podem ser divididas em práticas edáficas, vegetativas e mecânicas. O objetivo principal é evitar a erosão do solo, ao reduzir o impacto e a velocidade da água sobre a superfície favorecendo sua infiltração, ao invés do escorrimento superficial.
Dentre as práticas vegetativas de conservação, destaca-se que é necessário manter o solo protegido e com cobertura vegetal durante a maior parte do ano, utilizando rotação de culturas ou plantas de cobertura, protegendo o solo por meio de suas raízes e palhada após colheita ou dessecação. Como práticas edáficas, o uso de calcário, de fertilizantes e o não revolvimento do solo são boas alternativas. As práticas mecânicas envolvem o cultivo em linhas, a sistematização da área e a construção de terraços. Todas as tecnologias supracitadas evitam a degradação do solo, devolvendo parte dos nutrientes que foram extraídos pelas plantas ou pelo manejo inadequado.
Existem também estruturas que favorecem a chamada “colheita de água”. Isso pode ser realizado com a cobertura do solo ou com a construção de barragens e drenagens subsuperficiais. Essa prática converte o solo em um grande sumidouro de água, podendo ainda fazer a conexão dessas estruturas a reservatórios para armazenamento hídrico. Na região do MATOPIBA, em que há ocorrência de chuvas torrenciais, o uso de reservatórios é uma alternativa bastante interessante, já que a água pode ser armazenada na estação chuvosa para ser utilizada na estação seca.
O grande desafio é a integração de todas as práticas conservacionistas descritas. Um planejamento integrado e ambientalmente viável pode reduzir os custos de produção a curto e longo prazos, assim como agregar valor aos produtos via “certificações verdes”. O advento de novas tecnologias tende a facilitar o emprego dessas práticas e a aumentar a eficiência na utilização dos recursos ambientais. Dessa forma, é possível manter a utilização racional dos recursos hídricos, seja pelo setor agropecuário, grande provedor de alimentos, empregos (até quando?) e serviços ambientais, seja pelos setores urbano e industrial, provedores de mercado e serviços; e empregos e bens de consumo, respectivamente.
Referência
MAGALHÃES, L. A.; MIRANDA, E. E. MATOPIBA. Quadro natural. Embrapa Monitoramento por Satélite. Campinas, SP. (Nota técnica 5). Disponível em:< https://www.embrapa.br/gite/publicacoes/NT5_Matopiba_Quadro_Natural.pdf>. Acesso em: 16 set. 2015.
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