Há uma grande discussão, mundo afora, sobre o cooperativismo na contemporaneidade. A pergunta central é se a doutrina cooperativista, lastreada em princípios universais pouco flexíveis, ainda é sustentável, ou, mais além, se é possível a sobrevivência das cooperativas na economia globalizada, sendo elas, em geral, organizações de atuação local.
Empiricamente, é possível dar uma resposta bastante clara a esta questão. Basta comparar, de forma até simplista, o cenário no qual nasceram as primeiras cooperativas, a partir de Rochdale (bem depois do estabelecimento da doutrina) com o atual.
Naquele então, a revolução industrial havia provocado grande exclusão social (desemprego, desesperança, falta de perspectivas), ao lado do surgimento de classes bem mais ricas que a grande maioria das pessoas. Desde aí, e até a queda do Muro de Berlim, o cooperativismo foi aceito como a 3ª via para o desenvolvimento socioeconômico, entre o capitalismo e o comunismo. Foi a primeira onda da história da cooperação.
A queda do Muro, porém, desmanchou a primeira e a segunda vias, eliminando assim a idéia de terceira via. Mais que isto, a efeméride marcou o enlace entre globalidade econômica e liberalismo comercial, libertando as bestas apocalípticas do terceiro milênio que são a concentração de riqueza e a exclusão social, monstros siameses cujo galope infernal esta destruindo os valores básicos da equidade – solidariedade, ética, moral, coletivismo - e dando vigor a outros valores, execráveis, como a ambição, o individualismo, o egoísmo, a corrupção.
Tudo isso vai, tal como em 1840, destruindo o bem estar do cidadão comum, tirando-lhe esperanças, subtraindo-lhe a felicidade. E, no coletivo, ameaçando a democracia e a paz.
Há, portanto, uma certa similaridade entre o cenário atual, com esta frenética cavalgada excluidora, e o de um século e meio atrás, quando de Rochdale.
E embora as realidades sejam tão díspares – em função dos avanços tecnológicos, da rapidez das comunicações, do crescimento demográfico, para ficar em mínimas condições – a similaridade tem o condão de estimular o cooperativismo, na medida em que é na crise que as pessoas se unem para cooperar.
As diferenças entre os cenários, porém, conferem ao movimento um novo papel, que transcende a tradicional função socioeconômica, para um outro capítulo político relevante, o da defesa da democracia e da paz.
Tal afirmação se traduz na capacidade incrível que as cooperativas têm de gerar empregos (combatendo a exclusão social) e de fazer frente à gigantesca empresa capitalista destinada a dar lucro a poucos donos.
Esta nova característica exige que a cooperativa seja uma empresa inserida no mercado, eficiente e competitiva, oferecendo a seus membros e à comunidade bens e serviços que lhes ampliem a felicidade e o bem estar, defendendo a paz e a democracia. Este é o novo paradigma, que caracteriza a Segunda Onda da doutrina de cooperação, o desafio do terceiro milênio para este fantástico movimento que reúne mais de 800 milhões de associados individuais em todos os continentes.
Há ainda a teoria do Capital Social, de Amartya Sem, Nobel de economia em 1998, a provar que coesão social, confiança e participação são a chave do desenvolvimento. E, é óbvio, as cooperativas são o cofre ideal para estocar capital social.
Todas estas considerações indicam que estamos frente a um renascimento do cooperativismo, e seus valores e princípios, apesar das limitações – universais – em termos de recursos humanos, capital, legislação, etc.
Mas, tudo isto é empírico.
Faltam estudos acadêmicos que comprovem estas idéias, inclusive colocando foco em um ponto essencial: estão os princípios do cooperativismo, reformados em 1995, de acordo com a atualidade?
Felizmente a OCB e as principais entidades e instituições ligadas ao cooperativismo brasileiro estão envolvidas nesta discussão com bastante interesse, disposição e comprometimento.
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