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Marina Torres, Embrapa Milho e Sorgo
06/12/2016
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Resíduos produzidos nas fazendas e capazes de causar impactos ambientais negativos se mal descartados podem ser matéria-prima de fertilizantes eficazes. É o que tem demonstrado estudo realizado pela Embrapa Milho e Sorgo (MG) com a cultura de milheto. Foram utilizados resíduos orgânicos suplementados com minerais e microrganismos solubilizadores, que tornam o fósforo disponível para a planta. Os pesquisadores registraram maior crescimento das plantas, maior extração de nutrientes e maior disponibilidade de fósforo no solo.
Adubos alternativos podem ser produzidos a partir de resíduos como cama de frango, estercos e restos de culturas, materiais orgânicos que, se não receberem destinação adequada, podem impactar o meio ambiente. O fertilizante também recebe uma mistura de fonte mineral, como pó de rochas, e ainda podem ser adicionados microrganismos solubilizadores, como bactérias que aumentam a disponibilidade de nutrientes para as plantas.
O uso combinado de microrganismos, resíduos orgânicos e pó de rochas como fonte de fósforo apresenta um benefício ambiental significativo, conforme explica a pesquisadora da Embrapa Milho e Sorgo Christiane Paiva. "Como na agricultura altas doses de fósforo precisam ser adicionadas ao solo por meio de fertilizantes químicos, suprir, mesmo que parcialmente, essa demanda fazendo uso de adubos organominerais, adicionados de microrganismos solubilizadores, é contribuir para a sustentabilidade agrícola", afirma a especialista. Para ela, a pesquisa demonstra o potencial de utilização desses microrganismos em associação com rochas fosfatadas como alternativa ao uso de fertilizantes convencionais.
Mais econômico
Além do benefício ambiental, a adubação organomineral é mais barata, uma vantagem importante já que os fertilizantes estão entre os principais insumos utilizados na agricultura, representando cerca de 30% dos custos de produção de uma lavoura. Por isso, o uso de fontes alternativas de adubação pode permitir aos produtores alcançar maiores rendimentos.
Um exemplo de resíduo gerado nas propriedades rurais que requer destinação adequada é a cama de frango, mistura do material utilizado como substrato que forra o piso de aviários e de dejetos, penas e sobras de ração. Durante muito tempo, esse resíduo da criação de frangos era utilizado como complemento na alimentação do gado bovino, mas esse uso foi proibido pelo Ministério da Agricultura, Pecuária e Abastecimento (Instrução Normativa nº 8, de 2004). Uma alternativa de destinação desse material é seu reaproveitamento como adubo.
Christiane Paiva explica que a cama de frango pode passar por compostagem para ser usada na adubação, a fim de que ocorra a disponibilização dos nutrientes de forma mais eficiente do que quando usada in natura.
Dessa forma, obtém-se um composto orgânico como fonte alternativa de adubação, e esse material ainda pode ser enriquecido. "O produto que resulta da compostagem tradicional não tem alto teor de fósforo ou potássio", informa a pesquisadora. Daí, a proposta de se trabalhar com fertilizantes organominerais. "A ideia é adicionar rochas aos compostos orgânicos. Além disso, para acelerar o processo de decomposição e liberação de minerais, são adicionados microrganismos solubilizadores. Esses microrganismos tornam mais eficiente o processo de disponibilização dos nutrientes".
Os microrganismos solubilizadores podem ser adicionados durante a compostagem, na produção dos fertilizantes organominerais, ou podem ser usados no momento do plantio. Neste caso, são aplicados no sulco, por cima do adubo organomineral.
Entenda a pesquisa
No experimento, foram feitos cultivos de milheto, adubados ou não com composto organomineral em doses crescentes, com pré-inoculação ou inoculação no sulco de plantio de microrganismos solubilizadores de fósforo. "O milheto foi usado como planta-teste, pois é uma gramínea que extrai muitos nutrientes do solo", explica Christiane. Após o plantio, foram coletadas amostras de solo para análises químicas e biológicas, e também parte aérea e raiz para determinação de massa seca.
A fonte de fósforo utilizada foi o Fosfato de Araxá, que foi misturado à cama de frango, esterco bovino e cana picada (parte orgânica). Essa mistura foi colocada em duas pilhas e deixada para compostagem. Em uma das pilhas foi realizada a pré-inoculação de microrganismos solubilizadores. A mistura da outra pilha recebeu a inoculação com os microrganismos solubilizadores apenas no sulco de plantio.
Foram utilizados microrganismos que pertencem à Coleção de Microrganismos da Embrapa Milho e Sorgo, bactérias selecionadas em experimentos anteriores, sendo classificadas como eficientes na biossolubilização. Para preparo do inoculante, as bactérias crescem em um meio de cultura, um caldo nutriente. O inoculante foi aplicado na forma líquida, sendo pulverizado na pilha de compostagem ou sobre o composto durante a adubação no sulco de plantio.
Foram avaliados massa seca e nutrientes da parte aérea e das raízes das plantas e também o teor de fósforo disponível no solo. Os resultados demonstraram que a inoculação de microrganismos solubilizadores pulverizados no plantio resultou em maior crescimento de plantas de milheto, maior extração de nutrientes e maior disponibilidade de fósforo no solo.
Observou-se a superioridade dos tratamentos com fertilizantes organominerais inoculados no plantio, seguidos dos tratamentos com compostos organominerais pré-inoculados ou sem inoculação.
Experiência com hortaliça
O uso de fertilizante organomineral com microrganismos também já foi testado em sistema orgânico de produção de alface. Durante curso de mestrado da Universidade Federal de São João del-Rei (UFSJ), o técnico da Empresa de Assistência Técnica e Extensão Rural do Estado de Minas Gerais (Emater-MG) Adenilson de Freitas realizou pesquisa sobre a produção de compostos orgânicos enriquecidos com rochas e inoculante microbiano na cultura da alface.
Adenilson foi orientado pelo pesquisador da Embrapa Milho e Sorgo Ivanildo Evódio Marriel e avaliou a eficiência agronômica dos compostos. Concluiu que a incorporação de rocha fosfática e potássica e inoculante microbiano contribuiu para a melhoria da qualidade dos compostos como fonte de nutrientes para a cultura da alface em sistema orgânico de produção.
Os experimentos foram conduzidos em Capim Branco (MG), onde Adenilson atua como extensionista. O município é um dos principais polos de produção e fornecimento de hortaliças da região metropolitana de Belo Horizonte, com certificação de produtos orgânicos. Lá, agricultores já têm adotado a tecnologia dos fertilizantes organominerais com inoculação de microrganismos como alternativa ao uso de adubos químicos.
Tecnologia extrapola fronteiras
A produção de fertilizantes enriquecidos com microrganismos já foi tema de treinamento de pesquisadores africanos que estiveram na Embrapa Milho e Sorgo em 2015. Dentro do programa Agricultural Innovation MKTPlace, três pesquisadores do Mali participaram de visita técnica e curso sobre a tecnologia e sobre a produção de bioinoculantes.
O pesquisadores Francisco Adriano de Souza, Christiane Paiva e Ivanildo Evódio Marriel ministraram o treinamento para Amadou Hamadoun Babana, Adounigna Kassogué e Amadou Hamadoun Dicko, que atuam na Universidade de Bamako, no Mali.
Agricultural Innovation MKTPlace é uma iniciativa internacional apoiada por diversos parceiros com o objetivo de ligar especialistas e instituições brasileiros, africanos, latino-americanos e caribenhos para desenvolver, conjuntamente, projetos de pesquisa.
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