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Renata Silva, Embrapa Rondônia
13/04/2017
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Resultado de dez anos de pesquisa indica que castanheiras que receberam o tratamento silvicultural de corte dos cipós produziram um terço a mais de castanhas-do-brasil que as infestadas que não foram tratadas. O que antes era percebido por alguns extrativistas foi comprovado pela pesquisa, que quantificou e criou parâmetros para esse tratamento de baixo custo, garantindo mais ganhos de produção e renda aos produtores da Amazônia.
Além do aumento de 30% na produção de frutos das castanheiras com o corte dos cipós, o trabalho também demonstrou que esse efeito foi observado a partir do quinto ano após o corte. Para se ter uma ideia, depois de liberados os cipós, as castanheiras recuperaram suas copas e algumas que nunca haviam dado frutos começaram a produzir. Outras árvores muito infestadas por cipós e que não foram tratadas morreram, enquanto aquelas que receberam o manejo se recuperaram.
Na Reserva Extrativista Cazumbá-Iracema, em Sena Madureira (AC), resultados do corte dos cipós já foram notados. “Algumas castanheiras infestadas não produziam. Seguimos a orientação de cortar os cipós e há árvores que já estão produzindo até cinco latas de ouriço”, afirma o presidente do Núcleo de Base Cazumbá, o extrativista Afonso da Silva.
Embasados na pesquisa, cientistas recomendam remover apenas os cipós que infestam a copa das castanheiras e que estão enraizados próximo ao tronco, dentro de um raio de cinco a dez metros. Cabe ressaltar que o corte de cipós em castanheiras é uma atividade fácil de ser executada e de baixo custo, pois o corte pode ser feito na época da safra e, em média, leva menos de um minuto para cortar um cipó.
Produção com sustentabilidade
Este trabalho, desenvolvido por pesquisadores da Embrapa Acre e de Rondônia e das universidades norte-americanas da Flórida e do Alabama, se destaca por oferecer aos extrativistas informações quantificadas e recomendações de tratamento silvicultural para as castanheiras. “Temos buscado técnicas para melhorar a produtividade aliada à conservação dos recursos naturais. Isso incentiva o extrativista para que ele continue na atividade e obtenha renda com a manutenção da floresta”, explica a pesquisadora da Embrapa Rondônia Lúcia Wadt.
Segundo ela, as recomendações já foram feitas a diversas comunidades que têm adotado a prática com sucesso e vêm alcançando maior ganho na renda familiar. “Para a pesquisa, é este o resultado que buscamos: utilizar a ciência por meio da experimentação para promover melhoria de renda significativa aos produtores, sempre respeitando o meio ambiente e promovendo a manutenção da floresta em pé”, arremata.
Uma das localidades que adotaram as recomendações da pesquisa foi a do Seringal Porvir, em Epitaciolândia (AC), na Reserva Extrativista Chico Mendes. Segundo o presidente do Núcleo de Base Wilson Pinheiro II, Severino da Silva Brito, todos os extrativistas da comunidade já adotam essa prática. “O meu pai já fazia isso, ele falava que precisava cortar para evitar que os galhos das castanheiras secassem, mas eu não levava muito em consideração. Depois das práticas com o pessoal da Embrapa, a gente passou a ter esse hábito. Houve uma castanheira que bateu o recorde. Produzia meia lata de ouriço, nós podamos os cipós e, depois de dois anos, coletamos seis latas. Hoje em dia, não tem mais nenhuma castanheira com cipó na minha área. Eu digo que quem tem castanhal deve cortar o cipó para ter mais castanha”, conta.
A pesquisa
Por causa da importância da castanha-do-brasil (Bertholletia excelsa Bonpl.) para a economia extrativista, chamaram a atenção dos pesquisadores as quedas na renda familiar de extrativistas verificadas nos últimos anos e atribuídas à baixa produção das castanheiras. Os produtores relataram que cipós presentes nas castanheiras diminuíam a produção de frutos. Então, para testar essa hipótese, os cientistas realizaram experimento com 138 castanheiras, conduzido e avaliado por dez anos, na Reserva Extrativista Chico Mendes, no Estado do Acre.
Nesse trabalho, 454 cipós foram cortados de 78 castanheiras com diferentes intensidades de infestação. O corte dos cipós foi feito em duas partes, próximo ao solo e a uma altura de dois metros do chão. Todas as árvores do experimento, tanto as que receberam o corte de cipós quanto aquelas que não receberam o corte foram monitoradas uma vez ao ano para coleta de dados de produção de frutos e acompanhamento da reinfestação pelos cipós. Todos os cipós que rebrotaram ou qualquer infestação nova em castanheira tratada foram cortados sistematicamente para manter as árvores tratadas livres de cipós. Durante os quatro primeiros anos, não houve diferença de produção entre castanheiras tratadas e não tratadas. Os bons resultados começaram a ser percebidos a partir do quinto ano, quando as árvores que receberam o corte de cipós produziram melhor do que as que não tiveram os cipós cortados.
De acordo com a pesquisadora Lúcia Wadt, ao analisar o porquê da melhoria da produção, percebeu-se que a competição por luz na área da copa da árvore e a competição por água e nutrientes no solo tiveram efeito. Castanheiras com menos de 25% de sua copa coberta com cipós produziram mais frutos que aquelas que apresentaram mais de 25% da copa infestada. A quantidade de cipós enraizados próximo do tronco da castanheira também foi importante, pois quanto maior o número de cipós próximo do tronco da castanheira, menor a produção de frutos.
Importância econômica e social da castanheira
A importância da castanha-do-brasil é reconhecida para a economia extrativista. Trata-se da única castanha comercializada internacionalmente que é coletada em florestas naturais por populações tradicionais. Além disso, a castanheira é uma árvore gigante da Floresta Amazônica e serve como estrutura para seres vivos de diferentes espécies que habitam ao seu redor. Seu tronco pode chegar a mais de três metros de diâmetro, e a planta, a 50 metros de altura.
Em 2014, a castanha-do-brasil movimentou 79,6 milhões de reais na produção primária (IBGE, 2016). A grande maioria dessa produção vem de unidades de conservação, terras indígenas e assentamentos rurais, sendo responsável por boa parte da renda de mais de 55 mil pessoas representadas por povos e comunidades tradicionais e agricultores familiares (MDA; MMA; MDS, 2009).
Dada sua importância para a economia regional, a queda na renda familiar de extrativistas foi atribuída à baixa produção das castanheiras. Esta ligação entre a produção dos frutos e a renda pode ter consequências diretas para a conservação da floresta, pois, com a baixa coleta, os extrativistas podem desistir da atividade e partir para outras que alteram a floresta, como a pecuária e a agricultura intensiva.
As relações entre produção dos frutos da castanheira, renda familiar e manutenção das florestas conservadas tornam a castanheira uma espécie-chave para estratégias de conservação da Amazônia. Apesar da importância econômica e da conservação da espécie Bertholletia excelsa, ainda são poucos os estudos sobre a variação na produção e tratamentos silviculturais que podem favorecer a produção de frutos.
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