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Genética Animal    
Marcador molecular permite checar a qualidade do embrião bovino
Objetivo é avaliar a qualidade dos embriões para reduzir o percentual de mortalidade embrionária, que ainda pode chegar a 60%
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José Tadeu Arantes, Agência FAPESP
08/03/2016
 
Estudo realizado na Faculdade de Medicina Veterinária e Zootecnia da Universidade de São Paulo (FMVZ-USP) em parceria com o Laboratório Innovare de Biomarcadores da Universidade Estadual de Campinas (Unicamp) definiu um procedimento pioneiro para aferir a qualidade de embriões bovinos em técnicas de reprodução assistida. O artigo “Analysis and characterisation of bovine oocyte and embryo biomarkers by matrix-assisted desorption ionisation mass spectrometry imaging” foi publicado como matéria de capa pela revista Reproduction, Fertility and Development.
 
O novo procedimento é resultado da pesquisa “Análise do perfil proteico e lipídico de embriões pré-implantacionais bovinos obtidos por fecundação in vitro, transferência de embriões e por transferência nuclear de células somáticas pela técnica de espectrometria de massas”, desenvolvida por Roseli Fernandes Gonçalves, com apoio da FAPESP por meio do programa Jovens Pesquisadores em Centros Emergentes.
 
Nesse estudo, Gonçalves contou com a colaboração de pesquisadores do Departamento de Reprodução Animal da FMVZ-USP; do Laboratório Innovare de Biomarcadores, da Universidade Estadual de Campinas (Unicamp); da Universidade de Antuérpia, na Bélgica; e da Universidade do Estado da Pensilvânia, nos Estados Unidos.
 
“Apesar do alto nível tecnológico da pecuária brasileira e de o Brasil ser o maior produtor mundial de embriões bovinos in vitro, respondendo por aproximadamente 70% da produção global, o percentual de mortalidade embrionária ainda é muito alto, chegando em alguns casos a 60%. Nosso objetivo era definir um marcador que possibilitasse avaliar a qualidade dos embriões, de forma a reduzir a perda embrionária, fazendo com que os embriões transferidos viessem a termo”, disse Gonçalves.
 
Gonçalves e colaboradores empregaram a espectrometria de massa, na modalidade Maldi-MSI (matrix-assisted laser desorption ionization / mass spectrometry imaging), para mapear marcadores moleculares presentes em oócitos (óvulos imaturos) e embriões bovinos. “Essa técnica já era utilizada, mas apenas em tecidos, pois se acreditava que seria impossível obter registros com resolução suficiente a partir de um pequeno conjunto de células. Nosso trabalho foi o primeiro no mundo a obter esses registros – sem a necessidade de preparo, do uso de anticorpos ou de outro marcador”, afirmou a pesquisadora.
 
A espectrometria de massa é uma técnica que envolve a vaporização da amostra para a produção de íons que possibilitam determinar sua composição. “Empregamos o espectrômetro do Laboratório Innovare da Unicamp, coordenado pelo professor doutor Rodrigo Catharino. Os íons são produzidos por pequenos disparos de laser em pontos adjacentes da amostra. E cada disparo gera um espectro de massa. Associando o ponto ao espectro correspondente, é possível localizar as moléculas de interesse. No nosso caso, a molécula de interesse era um lipídio”, informou Gonçalves.
 
De fato, os lipídios funcionam como “assinaturas químicas” do estágio de desenvolvimento embrionário. O artigo descreveu o mapeamento de oócitos e de embriões bovinos em diferentes fases do desenvolvimento (com duas, quatro, oito células e como blastocisto). “A principal diferença de nosso procedimento em relação a outras técnicas de espectrometria de massas que também utilizam um único oócito ou embrião foi que localizamos o biomarcador individualmente, determinando, por exemplo, se ele estava ou não presente na zona pelúcida (a membrana que reveste o oócito e o embrião). Conseguimos quantificar o lipídio in situ e acompanhar se ele aumentava ou diminuía em quantidade nos diferentes estágios do desenvolvimento embrionário”, explicou a pesquisadora.
 
Ela ressaltou que a espectrometria de massa é uma alternativa mais rápida e completa do que práticas usuais para a produção de imagens de células isoladas, como microscopia eletrônica e a imuno-histoquímica. “A Maldi-MSI permite estudar a composição lipídica de um único oócito ou embrião, economizando tempo e material, enquanto os métodos convencionais de análise requerem a utilização de muitas amostras e processos que envolvem manipulação química, separação e caracterização de componentes por meio de técnica trabalhosas, como cromatografia gasosa, na qual a molécula de lipídio é ‘quebrada’, dificultando a obtenção da informação estrutural sobre a molécula intacta”.
 
Espectrometria de massas
Isso talvez fique mais claro com o detalhamento do processo de espectrometria de massas tal como foi utilizado pelos pesquisadores. Cada embrião é colocado em um dos pequenos poços da placa de Maldi. O aparelho vaporiza a amostra e dispara feixes de laser que formam íons a partir das moléculas presentes. Ao passarem pelo analisador do espectrômetro, os íons sofrem a ação de um campo eletromagnético: a componente elétrica do campo acelera ou desacelera o fluxo; e a componente magnética modifica a direção da trajetória. A amplitude da deflexão da trajetória depende da relação massa/carga. Quanto mais leve o íon, maior a deflexão. E o detector registra a abundância de cada íon por meio de um espectro de massa. A associação dos espectros aos respectivos pontos da amostra possibilita localizar espacialmente o marcador escolhido.
 
“Nosso procedimento contribuiu também para o aperfeiçoamento da técnica de Maldi-MSI, principalmente no preparo das amostras, uma vez que conseguimos os resultados utilizando uma placa de sílica sem precisar adicionar uma matriz de ácido orgânico para absorver a luz do espectrômetro, como usualmente se faz”, disse Gonçalves.
 
A pesquisadora descreveu o passo a passo da reprodução de bovinos in vitro. “Partimos do oócito, isto é, do óvulo ainda imaturo. Esse oócito é maturado durante 24 horas em um meio de cultura rico em hormônios, que reproduz as condições existentes in vivo. Uma vez maturado, incubamos o óvulo com os espermatozoides, para que ocorra a fecundação. Fecundado, o zigoto começa a clivar, duplicando sucessivamente o número de células. Sete dias depois da fecundação, o conjunto de células chega ao estágio de blastocisto, quando já pode ser transferido para o útero de uma vaca hospedeira ou congelado. Ao contrário do que ocorre na reprodução assistida em humanos, no caso de bovinos só transferimos um embrião. Por isso, é importante ter um parâmetro da qualidade desse embrião, para que o mesmo continue seu desenvolvimento, gere prenhez e resulte em bezerro.”
 
Como regra, a qualidade do embrião produzido in vitro é inferior à do embrião gerado in vivo. E isso ressalta o papel do marcador lipídico. Além disso, o rastreio dos lipídios é importante na criopreservação de óvulos e embriões. Se estes apresentarem muitas espécies de lipídios saturados, a membrana celular pode se romper com facilidade durante o congelamento.
 
“Claro que, para identificar o lipídio como marcador molecular, tivemos que perder os embriões utilizados na pesquisa. Mas, com o marcador identificado, nosso objetivo agora é chegar a um método não invasivo, no qual a presença do marcador, secretado pelo embrião, possa ser investigada no meio de cultivo, sem a necessidade de biópsia”, informou Gonçalves. Esse novo estudo, diretamente voltado para aplicação, já conta com apoio da FAPESP, recém-outorgado por meio do programa PIPE (Pesquisa Inovativa em Pequenas Empresas).
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