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O melhoramento genético no Brasil está vivendo um ótimo momento com o boom de tecnologias e não deixa mais nada a desejar dos países de primeiro mundo. Ano passado, foi lançada a DEP (diferença esperada na progênie) genômica para Nelore, através do uso da tecnologia de marcadores moleculares. A novidade vai melhorar a precisão dos programas de melhoramento e pode contribuir para a uma nova geração de rebanhos mais sustentáveis, através do desenvolvimento de animais que exijam menor tempo de abate e tenham maior conversão alimentar, eliminando menos metano na atmosfera. Mais de 99% das fazendas inscritas nos programas de melhoramento genético estão sendo capacitadas e treinadas e mais de 200 certificações foram emitidas para as fazendas, somente ano passado.
Para entender melhor o processo de avanço que está acontecendo no mercado e conhecer as novidades genéticas, o Portal Dia de Campo conversou com um dos maiores especialistas na área, o médico veterinário Raysildo Barbosa Lobo, doutor em melhoramento genético bovino e presidente da ANCP (Associação Nacional dos Criadores e Pesquisadores). Na entrevista a seguir, Lobo explica a DEP genômica e diz que é a hora e a vez do Brasil.
Portal Dia de Campo - Como se desenvolveu o mercado de melhoramento genético no Brasil?
Raysildo Lobo - O melhoramento genético de bovinos no Brasil vem sendo implantado e desenvolvido desde a década de 70, mas foi na primeira década desde milênio que nós tivemos um avanço maior, no sentido de produção, de valores genéticos ou de DEPs, bem como a própria sistematização e organização dos programas. Houve também o reconhecimento muito importante do mercado sobre a informação genética. Hoje, o mercado paga por essa informação. Atualmente, 70% das centrais de inseminação do Brasil provém de touros com avaliação genético, o que era totalmente diferente antes do ano 2003. Isso significa que os produtores estão mais engajados nos programas de melhoramento genético, o mercado acredita e o Brasil está com ferramentas para ampliar a sua produtividade no mercado de exportação de carne.
Portal Dia de Campo - Qual é a novidade para os produtores brasileiros?
Raysildo Lobo - Uma novidade muito importante foi o lançamento do Programa Nelore Brasil, ano passado, conduzido pela ANCP, juntamente com a Pfizer. Foram lançadas as DEPs auxiliadas pela genômica. Esse é um passo muito importante porque além das informações de genealogia, de desempenho e de progênie, nós incorporamos os marcadores moleculares. Isso equivale a colocar o Brasil em um clube altamente restrito de países que estão utilizando esta tecnologia. Começou nos Estados Unidos, em 2009, na raça holandesa, em 2010 se estendeu para o Angus e, em 2011, o Brasil foi o pioneiro no mundo em usar esta tecnologia em zebuínos.
Portal Dia de Campo - Alguns produtores ainda não sabem o que é DEP genômica, gostaria que o senhor explicasse.
Raysildo Lobo - DEP significa diferença esperada na progênie. De uma forma bem simples, a DEP é aquilo que a gente espera de superioridade que seja transmitido à progênie. É resultado do sequenciamento do genoma (que começou com o genoma humano há mais de 18 anos e há cerca de 2 anos passou a ser utilizado com os bovinos). É uma informação a mais no sentido de você ter uma maior capacidade de precisão, estaria errando menos.
Portal Dia de Campo - Como o produtor se beneficia na prática com o lançamento dessa DEP genômica para Nelore?
Raysildo Lobo - Ele tem uma maior acurácia na estimação da DEP. Por exemplo, quando o animal acaba de nascer você pode ter uma DEP chamada pedigree onde a acurácia é em torno de 10%. A acurácia significa o risco que você tem em usar um valor com uma determinada DEP e ela varia entre 0% e 100%. Se você tem um touro com acurácia de 60% significa que ainda faltam 40% de fatores que não foram identificados. Com os marcadores moleculares a gente identificou que uma acurácia de 10%, ainda no parto, poderia passar para uma acurácia de 25% ou até 30%, o que corresponderia a uma DEP de quando este animal tivesse seis descendentes, com cerca de 9 anos de idade.
Portal Dia de Campo - A sustentabilidade é uma questão latente hoje em dia. Como o melhoramento genético pode influenciar os impactos no meio ambiente e a emissão de gases estufa, como o metano?
Raysildo Lobo - Nós implantamos o Sistema Certificação Global G. Esse sistema é similar ao antigo sistema global GAP utilizado na Europa, onde temos três tipos de classificação. A classificação g1 é a qualidade da informação, desde a coleta dos dados ao treinamento da equipe, lotes de manejo, aferição da balança. A g2 diz respeito à certificação de fazendas que têm progresso genético, porque não basta participar do programa de melhoramento sem fazer o dever de casa. A classificação g3 é um trabalho de melhoramento genético inédito, onde já foram identificadas 41 fazendas, e diz respeito a esta sustentabilidade ambiental, controle da emissão dos gases estufa, principalmente o metano, e questão sanitária da fazenda. Nós fazemos um levantamento e depois são gerados indicadores para mostrar ao fazendeiro quanto ele está eliminando de poluentes. Isso é associado com o melhoramento genético para reduzir o tempo de abate do animal, porque ele fica menos tempo no pasto e evita a emissão de gases estufa por muito tempo. Com isso nós vamos recuperar a credibilidade dos produtores brasileiros, porque os resultados estão sendo fantásticos.
Portal Dia de Campo - Nós sabemos que a digestão dos ruminantes influencia diretamente na liberação de metano. É possível que a genética interfira ao ponto de criar uma DEP metano? Ou seja, fazer com que o animal tenha a necessidade de liberar menos metano?
Raysildo Lobo - É possível você identificar um gene que esteja relacionado a esta emissão de metano, através dos marcadores moleculares. Com isso, podemos produzir animais com menor emissão do gás metano. Isso é a mesma coisa que desenvolver animais que tenham maior eficiência de consumo alimentar e o produtor até melhora o ganho de peso do seu rebanho. Essa variabilidade genética existe e é possível, mas acredito que ainda demore uns 5 anos para a gente produzir esta DEP.
Portal Dia de Campo - Falando agora sobre o melhoramento genético de precisão, que ainda é novidade para alguns produtores. Como está o desenvolvimento desta tecnologia no Brasil?
Raysildo Lobo - O melhoramento genético de precisão implica em você estar sintonizado com a aplicação das tecnologias disponíveis para maximizar o progresso genético. Além da genética, envolve a parte ambiental, sanitária, a área de nutrição e manejo de pastagem. É você identificar animais com maior acurácia, tendo maior retorno no melhoramento genético e dando resultados mais claros em termos de produtividade. A gente está sendo buscando um sistema que ajude o produtor a reduzir as suas despesas e aumentar a lucratividade porque o produtor brasileiro está como uma margem de lucro muito estreita. Então, ele não pode errar, tem que ser preciso. Em 2008, nós atendíamos apenas 35% das nossas fazendas e, em 2011, atingimos 99,6% das fazendas dos programas de melhoramento. Fazemos visitas aos fazendeiros com treinamento e as mais de 200 certificações que aconteceram em 2011.
Portal Dia de Campo - Então, o senhor diria que o Brasil não está devendo mais nada em relação às evoluções em melhoramento genético no mundo?
Raysildo Lobo – Hoje, eu tenho a felicidade de observar estrangeiros vindo ao Brasil para conhecer tecnologias que eles nem têm lá, ou quando têm estão menos desenvolvidas. O Brasil é a sexta maior economia do mundo, um dos maiores exportadores de proteína animal e vegetal e nós estamos, às vezes, acima de países do primeiro mundo, em termos de tecnologia. As estimativas são de que as demandas de alimentação vão duplicar até 2050 e o Brasil é um dos poucos países que têm condições de atender esta demanda de mais de 7 bilhões de pessoas até lá.
Portal Dia de Campo - Quais são as perspectivas do melhoramento genético para os próximos anos? O que o pecuarista pode esperar de novidade e o que o senhor espera para essa próxima década?
Raysildo Lobo - Eu trabalho com melhoramento genético há 40 anos. As décadas de 70 e 80 eram anos em que a gente falava de genética e ninguém queria saber. O melhoramento genético só foi crescer a partir de 2003 e, desde então, houve uma explosão de tecnologias e o progresso foi imenso. Eu tenho a expectativa de que os avanços serão muito grandes de um ano para o outro.
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