No dia 20 de junho de 2012, no Rio de Janeiro, será iniciada a conferência mundial sobre o meio ambiente, denominada Rio + 20 (http://www.uncsd2012.org/rio20/) em alusão a Conferência das Nações Unidas sobre o Meio Ambiente e o Desenvolvimento (CNUMAD) – ECO 92 ou Rio 92, cujo tema escolhido foi: Economia Verde, desenvolvimento sustentável e erradicação da pobreza, onde a preservação do meio ambiente e o clima do planeta estarão entre os principais assuntos a serem debatidos.
A expectativa é que a Conferência Rio + 20 consiga comprometer os países, as organizações não governamentais (ONGs) e a comunidade internacional para a construção de uma economia verde e inclusiva, isto é, que consiga ser sustentável (economicamente viável, ambientalmente correta e socialmente justa) e que promova a redução das desigualdades sociais.
O grande desafio atual da humanidade é conciliar o desenvolvimento das nações, juntamente com o crescimento da população mundial, com a oferta dos recursos naturais, solo, água, ar e biodiversidade.
A Organização das Nações Unidas para Agricultura e Alimentação (FAO) estima que em 2050 a população mundial será de aproximadamente 9,1 bilhões de habitantes e que para suprir a demanda de alimentos será necessário dobrar a produção mundial atual de alimentos.
A própria FAO espera que o Brasil seja responsável pela produção de 40% deste aumento da produção de alimentos, em função dos diversos fatores favoráveis que o país dispõe, destacando-se: disponibilidade de terras agricultáveis, clima favorável, bom nível de tecnologias disponíveis e produtores capacitados e motivados para responder a este desafio.
Mas o que mais chama a atenção da comunidade internacional é que o Brasil possui tecnologias que lhe possibilita aumentar a produção de alimentos, de forma sustentável, sem a necessidade de expandir a área de produção, ou seja, que permitem intensificar a produção em áreas já cultivadas e recuperar áreas degradadas, em especial, de pastagens, incorporando-as ao sistema produtivo.
Trata-se de tecnologias desenvolvidas e adaptadas para a Agricultura Tropical (AT), isto é, aquela que se situa entre os trópicos de Câncer (latitude de 23º norte, que passa acima da Cidade do México) e de Capricórnio (23º sul, que corta o norte do Estado do Paraná), as quais surgiram no seio dos produtores rurais, em função das suas dificuldades e necessidades de resolverem problemas encontrados no dia a dia e que após aprimoramento pela pesquisa e validação regional pela assistência técnica e extensão rural vem sendo adotadas amplamente pelo produtores rurais, colocando o Brasil na posição de líder mundial em AT.
O exemplo mais sólido é o sistema plantio direto (SPD), que nasceu da necessidade dos produtores de estancarem o grave problema de erosão que carregava o solo preparado para o plantio, com o uso intensivo de arado e grades, para as partes mais baixas do terreno, assoreando nascentes, rios e represas, matando peixes e contaminando a água de cursos d’água utilizados para abastecimento humano. Com a adaptação de máquinas para plantio (semeadoras ou plantadeiras, como os produtores preferem denominá-las) sobre os restos culturais e o surgimento de herbicidas de controle total de plantas daninhas, os pioneiros Herbert Bartz, Frank Dikistra e Manoel Henrique Pereira (Nonô) conseguiram alavancar este sistema de cultivo que hoje é motivo de orgulho nacional.
O SPD é um sistema de cultivo que se baseia em três princípios fundamentais ou três pilares de sustentação: A = ausência de revolvimento do solo ou revolvimento mínimo da linha de plantio, proporcionado pelo uso de máquinas apropriadas; B = biodiversidade, alcançada pela rotação de culturas e pela diversificação de espécies; C = cobertura permanente do solo, possibilitada pela produção de palhada pelas culturas comerciais e/ou pelo cultivo de plantas de cobertura do solo.
A sustentabilidade do sistema depende do equilíbrio entre os seus pilares de sustentação, que podem ser comparados com as pernas de um banco de bar, conforme figura abaixo.
No SPD a cultura é semeada diretamente sobre os resíduos vegetais do cultivo anterior ou sobre a palhada da cultura de cobertura do solo, sem o preparo com grades e/ou arados.
A vegetação existente na área é exterminada com o uso de herbicidas de ação total (dessecantes), eliminando a necessidade de revolvimento do solo para controle das ervas invasoras ou plantas daninhas, o que acaba por desestruturá-lo, tornando-o mais suscetível à erosão.
A adoção do SPD proporciona a redução da erosão laminar, com diminuição de até 90% na perda de solo e consequentemente de corretivos e fertilizantes, além de reduzir em até 70% o consumo de combustíveis fósseis em relação ao Sistema de Plantio Convencional (SPC), contribuindo significativamente para a diminuição na emissão de gases de efeito estufa (GEE).
A redução do escorrimento da água também diminui o carregamento de sedimentos de solo que causam a contaminação da água que é utilizada para o abastecimento da população urbana, reduzindo substancialmente os custos do seu tratamento para se tornar potável.
Com o SPD, o solo fica protegido com resíduos vegetais (palhada), aumentando a infiltração da água das chuvas, reduzindo ou praticamente eliminando o seu escorrimento sobre a superfície, possibilitando a recarga dos aquíferos e a regularização de vazão das nascentes, que formam riachos e rios e alimentam os lagos e represas.
A Agência Nacional de Águas (ANA) reconheceu estes benefícios proporcionados pela utilização do SPD e adotou uma iniciativa pioneira de pagamento por serviços ambientais (PSA) denominada Programa Produtor de Água, que tem como objetivo a redução da erosão e assoreamento dos mananciais nas áreas rurais. O programa, de adesão voluntária, prevê o apoio técnico e financeiro à execução de ações de conservação da água e do solo, como, por exemplo, a construção de terraços e bacias de infiltração, a readequação de estradas vicinais, a recuperação e proteção de nascentes, o reflorestamento de áreas de proteção permanente (APP) e de reserva legal (RL), o saneamento ambiental etc. Prevê também o pagamento de incentivos (ou uma espécie de compensação financeira) aos produtores rurais que, comprovadamente contribuem para a proteção e recuperação de mananciais, gerando benefícios para a bacia e à população.
A concessão dos incentivos ocorre somente após a implantação, parcial ou total, das ações e práticas conservacionistas previamente contratadas e os valores a serem pagos são calculados de acordo com os resultados: abatimento da erosão e da sedimentação, redução da poluição difusa e aumento da infiltração de água no solo.
O caso mais conhecido é o dos produtores rurais de Extrema em Minas Gerais, que compõe a bacia do Rio Jaguari, o qual é o principal manancial do Sistema Cantareira, que abastece 8,8 milhões de pessoas da Grande São Paulo.
Os produtores localizados nas microbacias dos sete riachos e/ou ribeirões que compõe a bacia do Jaguari, que aderem voluntariamente ao projeto de nominado Conservador das Águas recebem um bônus para proteger as nascentes, melhorar o manejo das pastagens, reflorestar as matas ciliares etc, enfim fazer a adequação ambiental das propriedades.
São parceiros neste projeto a ANA, o Governo do Estado de Minas Gerais, a Prefeitura Municipal, o Instituto Estadual de Florestas (IEF) e a The Nature Conservancy (TNC).
Existem outras iniciativas relevantes como é o caso da implantação do PSA na bacia do Ribeirão João Leite, que abastece boa parte da população de Goiânia-GO, o qual prevê a criação de um fundo com diversas fontes de arrecadação de recursos para o pagamento dos produtores, o qual será administrado por um Conselho Gestor composto com representantes de todas as instituições envolvidas.
Com a adoção do SPD o assoreamento dos rios, lagos e represas também é reduzido, aumentando a vida útil dos reservatórios, em especial das usinas hidroelétricas, além de diminuir o desgaste das turbinas e os custos da sua manutenção, refletindo no menor custo da geração de energia elétrica.
Ao comprovar estes benefícios a Binacional Itaipu criou o Programa Cultivando Água Boa em parceria com a Federação Brasileira de Plantio Direto na Palha (FEBRAPDP), com o Instituto Agronômico do Paraná (IAPAR) e com a Emater-PR, que incentiva os produtores rurais das áreas marginais da represa e dos afluentes imediatos do Rio Paraná a adotarem o SPD de qualidade visando à redução da sedimentação do reservatório de água da usina hidrelétrica.
A constatação científica desses benefícios foi realizada recentemente pela ecóloga Jane Siqueira Lino, estudante de pós-graduação da Escola Superior de Agricultura “Luiz de Queiroz” (ESALQ), da Universidade de São Paulo (USP), orientada pelo professor Gerd Sparovek, do Departamento de Ciência do Solo, a qual utilizou um modelo espacial de erosão para avaliar a carga de sedimentos em 23 bacias hidrográficas do Rio Grande do Sul, comparando a região Noroeste do estado, predominantemente agrícola, com a região Sul tradicionalmente de pecuária, em três períodos distintos: 1985, início da adoção do SPD; 1996, ano de consolidação do sistema; e 2006, ano da sua máxima adoção.
Os resultados mostraram que a carga de sedimentos não variou nas bacias da região Sul entre os anos de 1985 e 2006. Na região agrícola, houve redução da carga de sedimentos entre os períodos 1985-1996 e 1996-2006, em função do aumento da adoção do SPD. Na prática, a adoção do SPD promoveu uma redução média de 82% na carga de sedimentos, valor próximo da redução das taxas de erosão que tem atingido até 90%.
Outras duas contribuições relevantes do SPD são a redução da emissão de GEE e o sequestro de carbono. A primeira é proporcionada pela redução do consumo de combustíveis e pela redução no uso de corretivos, fertilizantes e herbicidas. A segunda pela absorção do carbono atmosférico capturado pelas plantas ao realizarem a fotossíntese, o qual é transformado em biomassa (troncos ou hastes, ramos, folhas, raízes e frutos), que após a sua maturação e colheita tem seus resíduos depositados sobre o solo formando a palhada.
No SPD a palhada permanece na sua superfície degradando-se lentamente e juntamente com a decomposição das raízes das plantas proporcionam o aumento no teor de matéria orgânica do solo (MOS), que por sua vez reterá o carbono por longos períodos (sequestro), se o solo não sofrer perturbações (movimentação provocada por operações de preparo como gradagem e aração).
No final do ano de 2009, durante a realização da COP 15, o Governo Federal assumiu compromissos voluntários de redução da emissão de GEE e para dar suporte aos compromissos assumidos criou em 2010 o Plano Nacional de Redução das Emissões de Gases de Efeito Estufa, onde os diversos setores da economia passariam a desenvolver ações focadas na metas assumidas.
O Ministério da Agricultura, Pecuária e Abastecimento (Mapa) foi pioneiro na proposição de ações concretas através da criação do Programa Agricultura de Baixa Emissão de Carbono (Programa ABC). O Programa ABC quer ampliar o SPD em 8 milhões de hectares até o ano de 2020, dos atuais 25 milhões para 33 milhões de hectares. Ampliação do uso do trará uma possível redução de 16 a 20 milhões de toneladas de GEE, em equivalente carbono.
O Programa ABC conta com R$ 3,15 bilhões para financiar a adoção do SPD e de outras tecnologias que reduzem a emissão de GEE como a integração lavoura-pecuária (ILP), a integração lavoura-pecuária-floresta (ILPF), a recuperação de pastagens degradadas e a fixação biológica de nitrogênio.
Tramita no Congresso Nacional um projeto de lei que prevê a criação de uma Política Nacional de PSA onde se espera que os produtores rurais possam ser reconhecidos e remunerados pelos serviços ambientais gerados, continuando a produzir agroenergia, fibras e alimentos com segurança alimentar, de forma sustentável, gerando trabalho, renda e qualidade de vida no campo, melhorando a qualidade do ambiente para toda sociedade, enfim, transformando o nosso agronegócio numa potente e competitiva Economia Verde.
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