Estão se confirmando as expectativas colocadas neste mesmo espaço no número de janeiro da Agroanalysis, no artigo “Um bom ano”: os preços das commodities continuam bem acima da média histórica (alguns até subiram mais um pouco nos últimos dois meses), os custos dos insumos também aumentaram e já se ouve falar que os preços dos alimentos estão em um novo patamar, que não cairão mais... E até já tem gente dizendo que são os agricultores os culpados pela inflação...
Tudo conforme previsto. E a previsão não foi nenhuma arte de futurologia. Apenas bom senso e quilometragem. Apenas a certeza de mais um ciclo.
É tudo tão óbvio! Quando a oferta não atende à demanda e os estoques diminuem, os preços sobem. E tome inflação! Ninguém pergunta porque a oferta não cresceu, se houve seca, enchente ou o que... Como existe uma razão concreta para os preços subirem, os especuladores investem no setor, elevam ainda mais os preços e realizam lucros enormes. E tome inflação! Com os preços altos, todo mundo quer plantar mais para aproveitar a boa onda. Vão ser necessários mais insumos (adubos, sementes, máquinas, equipamentos, corretivos, defensivos, etc) e mais serviços (crédito, transporte, armazenagem, embalagem, distribuição) e tudo isso aumenta de preço. Os custos sobem. E tome inflação! Culpa do produtor, claro, este bandido que não pode ter lucro... Plantar mais e mais caro, para que?
O que não se diz é o outro lado desta obviedade: se todo mundo vai plantar mais, é claro que a produção vai crescer, e a oferta idem. E se o “tempo correr bem” (chuvas na hora certa), os estoques crescerão, atendendo com sobra a demanda. E os preços cairão. Inflação também cai. Alguém é responsável?
E mais: quando este equilíbrio se refaz, os preços agrícolas voltam a cair para a curva descendente normal, desaparecem os alarmistas do novo patamar ou os terroristas que chegam a dizer que vai haver guerra por causa disso.
E ninguém, ninguém mesmo, se lembra do essencial: os fabricantes de insumos e os supridores de serviços devem realizar seus lucros. Sendo assim, embora os preços agrícolas já sejam cadentes, os custos ainda sobem por um tempo, até os investimentos industriais terem sido amortizados. É aí que mora o perigo: preço agrícola baixo e custo alto significa inadimplência e endividamento. E tome renegociação de dívidas. Tão óbvio!!! Tão certo como dois e dois são quatro.
Ora, se estes ciclos são tão evidentes, o que precisa ser feito para evitar o desastre anunciado? Os países desenvolvidos já resolveram isso através de inúmeras medidas protecionistas. Nós, aqui no Brasil, só precisamos de um seguro agrícola funcionando plenamente. Um seguro contra riscos climáticos, contra pragas e doenças e sobretudo contra os problemas do mercado volátil...
Não é tão complicado. Mas depende substancialmente de vontade política do governo federal. Do governo todo, e não apenas do Ministério da Agricultura, que sempre insistiu nisso. E também dos governos estaduais, que não podem ficar esperando eternamente ações de Brasília.
Mas, o que acontece, na outra fase dos ciclos tão conhecidos?
Quando as coisas estão bem – como agora – o governo não se mexe porque acha que não precisa. E quando vem a quebradeira, a inadimplência, e uma renegociação é necessária para evitar o caos, o governo acusa os agricultores de especuladores, de maus planejadores, de caloteiros, de irresponsáveis ou inconsequentes. E tome briga interminável, porque em casa que falta pão todo mundo grita e ninguém tem razão.
Estamos, sim, em um bom ano.
Por isso mesmo, é hora de armar a estratégia indispensável para manter a estabilidade de renda no setor produtivo, porque isto interessa à toda a sociedade, e não apenas aos produtores rurais. Um país abastecido é um país em paz. E na paz a democracia floresce.
O que desejamos nós, além de paz e democracia?
* Coordenador do Centro de Agronegócio da FGV, presidente do Conselho Superior de Agronegócio da FIESP e professor de Economia Rural da UNESP/Jaboticabal
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