Tomando por base a problemática levantada na parte I deste comentário, levanto a pergunta: O QUE PODEMOS FAZER?
Para mitigar as elevadas taxas de erosão que ocorriam nas lavouras dos estados da região sul do Brasil, nos anos 70 e 80, foram desenvolvidas, adaptadas e resgatadas inúmeras tecnologias e práticas de conservação do solo. Assim sendo, foram colocadas à disposição da assistência técnica, da extensão rural e dos próprios agricultores desde metodologias de planejamento para o uso e o manejo adequado de cada tipo de solo cultivado até as mais avançadas práticas para o manejo conservacionista do solo, que poderíamos também dizer “para o manejo sustentável do solo”.
Estas práticas basearam-se inicialmente no tripé do mínimo revolvimento do solo (sem preparo do solo), da manutenção permanente da cobertura do solo (com plantas e/ou seus resíduos) e da seqüência planejada de culturas, ao que se chama de rotação de culturas, dando o ponta - pé inicial para o grande avanço do Sistema Plantio Direto no Brasil.
Mas esta visão não foi suficiente para resolver o problema da erosão, porque era, ainda, restrita às unidades de produção (às propriedades agrícolas) – enquanto que a erosão não respeita nem cercas nem porteiras. Com a implantação de projetos mais abrangentes denominados de Planejamento em Bacias Hidrográficas implantados nos três estados do Sul, no final dos anos 80/início dos 90, a visão de “conservação do solo” foi ampliada para “conservação do solo e da água” e o planejamento, abrindo as porteiras das propriedades, passou a ser realizado tomando como base a menor unidade de gestão do solo e da água, ou seja, a microbacia hidrográfica.
O planejamento passou da visão individual para uma visão sistêmica envolvendo comunidade (pessoas e suas organizações) e recursos ambientais (solo, água, flora e fauna), ou seja, a gestão do solo, da água e das florestas, principalmente estas, realizada de maneira conjunta, objetivando o bem comum de todos os habitantes da microbacia.
No meio de tudo isso começou a consolidação de propostas cujas discussões iniciaram, também, no final dos anos 70 através de um movimento chamado de Agricultura Alternativa. Propostas de modelos de transição da agricultura convencional para uma nova agricultura, uma agricultura sustentável, que respeita os recursos ambientais e que valoriza os recursos disponíveis na propriedade.
Graças a tudo isso (e um tanto mais não comentado) o Brasil deu um salto absolutamente significativo na produção de alimentos nos últimos 20 anos. Mostramos aos norte-americanos (e ao mundo) que podemos produzir como eles – tanto que hoje em dia eles visitam nossas lavouras para conhecer o melhor Sistema Plantio Direto do mundo. Mas um desafio está posto: o modelo americano não é sustentável. Desta forma teremos que mostrar que é possível produzir tão bem ou melhor do que eles mas de outra forma, de maneira sustentável, respeitando verdadeiramente o ambiente no qual vivemos, produzimos e do qual, apenas, fazemos parte como uma engrenagem de um motor.
A respeito de tudo isso, em um dos seus comentários (setembro 2010) o Prof. Ricardo Ralisch, Professor da Universidade Estadual de Londrina – UEL e Secretário da Federação Brasileira de Plantio Direto na Palha – FEBRAPDP sentenciou: “Os problemas se concentram nas cidades; as soluções se espalham pelo campo”. Com esta reflexão considero que já está mais do que na hora da cidade olhar para o campo; não apenas para buscar alimentos, mas para buscar exemplos para resolver os seus problemas já que está faltando um pouco de criatividade por parte dos “urbanóides”, não acham? E nas cidades?
Continuamos a reproduzir os mesmos erros de sempre; continuamos com os mesmos velhos vícios de sempre, embora já tenhamos belíssimos exemplos de mudanças graças a projetos inovadores de cidades como Curitiba, apenas para citar um deles. No restante .... tudo continua a ser reproduzido. As cidades continuam sem planejamento urbano. As cidades continuam sendo quadradas, com suas quadras mais parecendo cemitérios cujos túmulos respeitam implacavelmente ao traçado do esquadro, sem respeito à topografia; o asfalto continua a ser espalhado sobre os velhos paralelepípedos como uma maquilagem rejuvenescedora da paisagem urbana; as edificações continuam a ser levantadas sem respeito aos mananciais (e as cidades continuam sendo “cortadas pelos rios” e devastadas pelas suas enchentes); os córregos, riachos e várzeas, sempre que possível, continuam sendo vítimas de projetos caríssimos de micro e macro-drenagem em favor da ganância imobiliária; além, é claro, da contínua invasão dos morros e escarpas por famílias excluídas que a sociedade teima em não querer ver.
Corretas foram as sugestões do Prof. Moacyr Duarte (COPPE/RJ) por ocasião de sua participação no programa Globo News especial, veiculado pelo Canal Globo News em 10/01/2010, para discutir sobre a ocorrência de desastres naturais como àqueles ocorridos no Rio de Janeiro (réveillon 2009/2010, em Angra dos Reis) e no Alto Vale do Itajaí, SC (2008): “uma vez que conseguimos aprovar a Lei de Responsabilidade Fiscal, deveríamos passar a lutar pela implantação da Lei de Responsabilidade Ambiental para todos os nossos gestores públicos”. E sentenciou: “cada município deveria ter a sua própria Carta Geotécnica para fazer o planejamento de uso e ocupação do solo urbano”. E daí eu pergunto: Dos mais de cinco mil municípios brasileiros, quais têm a tal da carta geotécnica? Isto é equivalente ao planejamento de uso e manejo das microbacias hidrográficas lá co campo!
Já o Prof. Álvaro Rodrigues dos Santos (Divisão de Geologia/IPT, SP), no mesmo programa, disse estar convencido de que “é necessário constranger os gestores públicos para uma tomada de posição definitiva sobre tais problemas”. Para iniciar a resolver tudo isto, segundo o Prof. Duarte, é necessário: 1. Parar de ocupar o solo de maneira errada; 2. Parar de ocupar o solo desordenadamente, ou seja, sem planejamento; 3. Acabar com a omissão dos políticos; e, 4. Tentar conscientizar muitos daqueles que tem dinheiro a parar de fazer crimes ambientais.
Para isso também é necessário ousar e buscar novas idéias. Como disse Gustavo Restrepo, arquiteto e urbanista que revolucionou a cidade de Medelín, na Colômbia: “Para que conseguíssemos fazer algo diferente e resolver os problemas, assumiram o poder, pessoas que passaram a acreditar nos professores universitários e nos pesquisadores. Então assim foi possível mudar o espaço urbano de Medelín”.
Termino este comentário da mesma forma que o fiz na primeira parte: Por tudo isto, a erosão que já provocou muitos desastres no campo está provocando catástrofes nos aglomerados urbanos. Até quando senhores legisladores? Até quando senhores gestores públicos? Vamos buscar soluções para as cidades olhando para o campo?
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