Um dos grandes desafios a serem superados pela bovinocultura na Região Norte do país está relacionado às parasitoses, sendo o carrapato dos bovinos, Rhipicephalus (Boophilus) microplus, e as patologias por ele transmitidas um grande problema nas explorações pecuárias na Amazônia. A tristeza parasitária-bovina é a doença transmitida por carrapatos que causa maior preocupação, mas existem outras ameaças em potencial.
A cowdria, por exemplo, é uma doença infecciosa, transmissível e não contagiosa que afeta ruminantes domésticos e selvagens, caracterizada por febre, seguida de sinais neurológicos agudos ou hiperagudos, hidropericardite e freqüentemente gastroenterite severa. O agente etiológico é uma rickettsia, Ehrlichia ruminantium, transmitida por carrapatos do gênero Amblyomma e experimentalmente também por R. (B.) microplus.
A doença é endêmica no continente africano e foi introduzida no Caribe, com risco de expansão para outros países da América Central e do Sul, onde exista a presença do gênero do carrapato vetor e espécies susceptíveis à infecção, ou localidades que façam fronteira com países cujos rebanhos tenham a doença, já que é possível que formas larvais e ninfas de Amblyomma spp. sejam facilmente transportadas por longas distâncias através de aves migratórias.
Dentre os carrapatos encontrados no Brasil, o gênero Amblyomma apresenta a maior diversidade, com cerca de 32 espécies, além de mais uma recentemente confirmada no país. Neste gênero, A. cajennense é a espécie de maior importância médico-veterinária nas regiões Sudeste e Centro-Oeste do Brasil. Apesar de sua predileção em parasitar equinos, esta espécie tem baixa especificidade parasitária, principalmente nos estágios imaturos. Dessa forma, este ixodídeo tem sido encontrado parasitando uma grande diversidade de animais domésticos e silvestres.
Por outro lado, A. cajennense é uma espécie raramente relatada em áreas de floresta na região amazônica. Por ser típico do Cerrado, estabeleceu-se muito bem na costa brasileira onde a Mata Atlântica original foi destruída e substituída por áreas de vegetação secundária, tais como capoeiras e pastagens abandonadas ou mal manejadas. No ambiente amazônico, é possível que o A. cajennense passe a ter maior importância à medida que a floresta amazônica continue em processo de degradação pelo homem.
Um recente e extenso estudo sobre a fauna de carrapatos de Rondônia revelou a presença de 22 espécies de Ixodidae das quais 16 eram do gênero Amblyomma. Isso representa quase metade das 47 espécies de carrapatos da família Ixodidae que ocorrem no Brasil.
A identificação específica dos estágios imaturos de ixodídeos, especialmente o larval, é ainda um grande problema para a comunidade científica. Houve pouco avanço quanto aos aspectos da biologia desses estágios e o papel das larvas na transmissão de doenças. A grande maioria das larvas e ninfas das espécies de carrapatos que ocorrem na Amazônia brasileira permanece desconhecida, não havendo literatura disponível para estudo. A falta do diagnóstico acaba por restringir o conhecimento, levando a informações incompletas e às vezes errôneas, impossibilitando o progresso dos estudos nas áreas da bioecologia, co-evolução, epidemiologia, dentre outras relacionadas à sanidade animal e saúde pública.
Buscando preencher esta lacuna, a Embrapa Rondônia em cooperação com centros nacionais de referência em acarologia, como a UFRRJ, USP e Instituto Butantã, vem realizando estudos taxonômicos baseados em caracteres-diagnóstico para as formas imaturas, visando à construção de uma chave dicotômica para o gênero Amblyomma. A solução é importante para subsidiar futuros estudos bioecológicos de carrapatos e doenças transmitidas na Amazônia que envolvam espécies desse gênero, inclusive por conta da eventual ameaça de novas patologias.
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