Na primeira matéria vimos os dados gerais da agricultura familiar (AF) brasileira e como as características e seu modo de funcionamento pode contribuir para o desenvolvimento de um país no campo econômico relacionado à produção de alimentos e de matérias-primas de origem agropecuária. Nesta, vamos comentar como a AF pode contribuir estrategicamente para a segurança alimentar, segurança nacional, defesa do território e para a estabilidade dos governos.
Essa contribuição se dá especialmente através da oferta e da regulação dos preços dos alimentos e das matérias-primas. Os agricultores familiares são numerosos e, por suas características intrínsecas, geralmente sua produção é diversificada; no entanto, eles não têm muita capacidade de carregar estoques de alimentos. Por isso, eles mantêm a oferta regularizada e diversificada de seus produtos. Essa contribuição fica mais clara quando analisamos a recente crise (2007) ocorrida na Argentina, onde a AF tem pouca expressão. Os poucos, grandes e bem organizados produtores rurais argentinos encurralaram o governo, que se viu refém; por sua vez, a população urbana, exposta ao desabastecimento e ao aumento dos preços dos alimentos, também pressionou o governo, que se fragilizou ainda mais. Indiretamente tudo isso acabou afetando a segurança nacional daquele país.
Outra forma de contribuição da AF para a segurança nacional e a defesa do território pode ser observada também no custo governamental com a segurança do território. Territórios com baixa ocupação populacional implicam em custos maiores para manutenção de suas fronteiras. O contrário ocorre em regiões intensamente ocupadas pela AF, que têm alta densidade demográfica rural, cujas atividades sócio-culturais, civis e econômicas facilitam e reduzem os custos de manutenção das fronteiras. Evidência disso é o alto custo do governo brasileiro para manter as fronteiras das pouco povoadas regiões Norte e Centro Oeste, quando contrastada com o custo na região Sul, intensamente ocupada pela AF. Além disso, em territórios pouco povoados fica facilitado o tráfico de drogas, de armas, de bens (p.ex, veículos e cargas, animais, etc), de material genético e mesmo de doenças. Nos casos de doenças, basta lembrarmos que Santa Catarina é o Estado com maior proporção de AF, e é pioneiro e excelência em defesa sanitária animal no Brasil. Prova disso é que a última entrada de aftosa no Brasil se deu nas regiões pouco povoadas e não na região Sul do Brasil, onde predomina a AF.
As especificidades da AF também a qualificam a dar contribuições singulares no campo ambiental. Entre essas formas de contribuição podem ser destacadas a adoção de sistemas produtivos energeticamente mais eficientes, usando menos energia fóssil e mais energia renovável; o uso de sistemas que respeitam mais a harmonia ambiental e entre as espécies, aproveitando as sinergias naturais entre atividades exploradas economicamente; modos de produção orgânica e agro-ecológica, cujos produtos são mais saudáveis aos consumidores; e, ainda, maior contribuição para manutenção dos chamados “serviços” prestados pela natureza. Mas este é um tema que merece ser tratado de forma mais detalhada oportunamente.
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