Estudo realizado no sul de Mato Grosso do Sul demonstrou que controlar percevejos e lagartas da soja seguindo as orientações do Manejo Integrado de Pragas (MIP) aumenta a margem de lucro do produtor ao promover uma economia de pouco mais de R$ 125,00 por hectare. A pesquisa estimou ainda que se a prática fosse adotada em todas as lavouras de soja do Brasil - uma área de aproximadamente 33.228.400 hectares - poderia gerar um benefício econômico da ordem de R$ 4 bilhões, devido à economia com inseticidas e gastos com a aplicação dos produtos.
O entomologista Crébio José Ávila, pesquisador da Embrapa Agropecuária Oeste (MS), explica que apesar da eficiência do MIP-Soja na redução do uso de inseticidas nas lavouras, especialmente na última década, tem-se observado um retrocesso nos programas de manejo de pragas da soja. “Em alguns casos, houve um abandono dessa estratégia, que exige muita presença e atenção do produtor nos diversos estádios das lavouras, o que fez com que houvesse um aumento excessivo de aplicações de inseticidas nas plantações, com consequências indesejáveis do ponto de vista econômico, ecológico e ambiental”, explica.
Segundo o cientista, o uso do MIP pode contribuir indiretamente com melhorias na qualidade de vida da população, pois o emprego de estratégias limpas de manejo como o controle biológico natural no agroecossistema reduz a exposição ambiental aos químicos, uma vez que menos produtos são pulverizados anualmente. O pesquisador afirma que a prática contribui para a sustentabilidade social, econômica e ambiental.
Economia de mais de R$ 300 mi só no MS
A pesquisa realizou o monitoramento e o manejo integrado dos insetos-praga e de seus inimigos naturais nas lavouras do estudo, ao longo de duas safras consecutivas: em 2014/2015, no município de Caarapó; e na safra 2015/2016, em Dourados, ambos em Mato Grosso do Sul.
Em Caarapó, o trabalho foi conduzido em uma área de aproximadamente 70 hectares, enquanto em Dourados a área foi de 25 hectares. Duas áreas comparativas também serviram como referência para a pesquisa, ambas manejadas segundo as orientações do produtor, sem nenhuma interferência da equipe do MIP.
A pesquisa contou com apoio financeiro da Fundação de Apoio ao Desenvolvimento do Ensino, Ciência e Tecnologia do Estado de Mato Grosso do Sul (Fundect), em parceria com o Conselho Nacional de Desenvolvimento Científico e Tecnológico (CNPq), sendo o MIP conduzido pela bolsista do Programa de Desenvolvimento Científico Nacional (DCR), Viviane Santos, atualmente professora do Instituto Federal de Educação, Ciência e Tecnologia de Mato Grosso do Sul (IFMS/Campus Dourados).
Santos explica que a análise do custo das aplicações de inseticidas para o controle de lagartas e de percevejos, nos dois ambientes de controle de pragas, comprovou que na área do MIP conduzida em Dourados na safra 2015/2016, houve uma economia de R$ 125,58 por hectare. “Na área estudada, se o produtor tivesse seguido as orientações do MIP em todos os 360 hectares de soja de sua propriedade, ele teria uma economia total de cerca de R$ 45 mil. Extrapolando-se esse valor de redução de custo para todo o estado de Mato Grosso do Sul, que na safra 2015/2016 teve uma área cultivada com soja de 2.430.000 hectares, o benefício econômico seria de mais de R$ 300 milhões”, estima Viviane Santos.
Menos risco ambiental
O uso do MIP extrapola os resultados econômicos e contribui para o controle biológico natural no agroecossistema, bem como reduz o risco de contaminação ambiental, uma vez que menos produtos são pulverizados no ambiente. Porém, o sucesso desse tipo de manejo exige dedicação, acompanhamento e presença do agricultor na lavoura. Sua adoção deve ter início antes mesmo da instalação da cultura, por meio da realização de monitoramento do grupo de pragas presentes na área a ser manejada para o plantio.
“A adoção e o manejo devem ser realizados conforme as recomendações técnicas da Comissão de Pesquisa de Soja da Região Central do Brasil visando garantir um controle efetivo de pragas em todos os estádios da cultura”, recomenda Ávila. “O ponto central do MIP consiste em monitorar a base da população de pragas amostradas e que se encontram presentes nos estádios da lavoura, observando-se os níveis de ação preconizados pela pesquisa. Por isso, a realização de pulverizações programadas de inseticidas com base em calendários deve ser evitada”, salienta o pesquisador.
Ávila explica ainda que entre as tecnologias sugeridas pelo MIP, destacam-se a observação de pontos simples, tais como: os níveis de ação estabelecidos pela pesquisa, especialmente em relação a lagartas e os percevejos; os métodos efetivos de amostragens e de monitoramento das pragas e de inimigos naturais; o controle biológico natural e aplicado na cultura; e a disponibilidade de produtos químicos e biológicos seletivos para serem aplicados quando for realmente necessário. Ele acrescenta ainda que o MIP-Soja também preconiza o cultivo das plantas transgênicas Bt que expressam proteínas que afetam insetos desfolhadores, como lagartas da soja e a falsa-medideira.
Controle biológico
“Nesse estudo observamos a presença de diversos inimigos naturais, como as aranhas, especialmente na área em que se conduziu o MIP. Elas são muito importantes para as lavouras de soja, pois são predadoras naturais que se alimentam de insetos-praga”, explica Santos.
Além disso, na área do MIP, em comparação com a área do produtor, observou-se também maior incidência do fungo Nomureae rileyi durante o início do mês de fevereiro. “Esse, também inimigo natural, é um fungo que ataca as lagartas da soja e a falsa-medideira, causando uma doença nesses insetos desfolhadores. Sua presença nas lavouras é muito importante, pois ajuda a combater pragas”, acrescenta Ávila.
Experiência e dedicação
O produtor rural de Dourados Maicon André Zorzo é o proprietário da área em que a pesquisa com o MIP foi conduzida na safra 2015/2016. Filho de agricultor e criado na lida do campo, ele conta que desde criança já ouvia falar sobre MIP e, por isso, acredita que esse tipo de manejo é uma estratégia que possibilita a redução do custo de produção, contribui com a sustentabilidade e permite o uso de insumos de forma racional.
“O produto químico tem um custo elevado e todas as vezes que for possível evitar seu uso será ótimo. Dessa forma, preservamos o meio ambiente e temos um nível menor de interferência. Esses produtos, se forem tecnicamente bem posicionados e utilizados somente quando houver de fato uma necessidade, não geram transtornos à natureza”, acrescenta.
“Nós, produtores, percebemos que temos alguns paradigmas que ainda precisam ser quebrados. No meu caso, eu continuei fazendo o manejo do meu jeito, e observei que, especialmente em relação às lagartas, eu poderia ter economizado muito com insumos. A frequência e a maneira como se faz o monitoramento semanal das lavouras permite que as aplicações sejam feitas somente quando for necessário, não de forma preventiva ou por uma questão de conveniência operacional”, destaca Zorzo.
Ele destaca que participar do trabalho de pesquisa foi uma experiência muito útil, que enriqueceu seus conhecimentos e possibilitou a adoção correta do MIP em suas propriedades. “No final da história, foram menos aplicações, menos custo e a produtividade foi idêntica. Creio que o com o MIP é possível fazer o controle de pragas de forma segura e sem prejuízos. Porém, o método exige dedicação e monitoramento”, relata
O que é MIP
O Manejo Integrado de Pragas (MIP) é uma prática agrícola que envolve o ambiente e a população da praga. O pesquisador da Embrapa Crébio José Ávila explica que o MIP utiliza diversas técnicas apropriadas ao manejo das lavouras com a finalidade de manter a população da praga em níveis abaixo daqueles que poderiam provocar danos econômicos. “O ponto central do MIP não é eliminar completamente os insetos-praga das lavouras, e sim realizar monitoramentos utilizando metodologia e frequência adequadas, com o objetivo de controlar os insetos-praga corretamente e no momento certo, evitando o desperdício ou excesso no uso de inseticidas nas lavouras”, esclarece Ávila.
As pesquisas com MIP-Soja tiveram início no Brasil nos anos 1970, por meio de parceria envolvendo diferentes instituições de pesquisa, como a Embrapa, e de extensão rural. Na época, estudos estabeleceram os níveis de dano para as principais pragas desfolhadoras e sugadoras na cultura da soja e recomendaram o uso de inseticidas apenas quando fosse necessário, ou seja, quando as populações das pragas estivessem iguais ou acima do nível de controle. Esses estudos foram aprimorados ao longo dos anos 1980, quando foi desenvolvido o controle biológico da lagarta da soja com o uso do Baculovirus anticarsia. Nos anos 1990, uma nova tática de manejo foi também incluída no MIP: o controle biológico dos percevejos fitófagos por meio do uso de parasitoides de ovos. Todas essas estratégias reduziram em mais de 50% o uso de inseticidas nas lavouras, sem quebra no rendimento de grãos da cultura.
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